Notícias - Igrejas no Mundo

Sínodo dos Bispos - Documento Final
18/12/2018
SÍNODO DOS BISPOS 
XV ASSEMBLEIA GERAL ORDINÁRIA 
OS JOVENS, A FÉ 
E O DISCERNIMENTO VOCACIONAL 
DOCUMENTO FINAL
27 de outubro de 2018Cidade do Vaticano 

SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
PROÉMIO
I PARTE
«PÔS-SE COM ELES A CAMINHO»
Capítulo I. Uma Igreja à escuta
Capítulo II. Três pontos cruciais
Capítulo III. Identidade e relações
Capítulo IV. Ser jovem hoje
II PARTE
«os seus olhos abriram-se»
Um novo Pentecostes
Capítulo I. O dom da juventude
Capítulo II. O mistério da vocação
Capítulo III. A missão de acompanhar 
Capítulo IV. A arte de discernir
III PARTE
«VOLTARAM IMEDIATAMENTE»
Uma Igreja jovem.
Capítulo I. A sinodalidade missionária da Igreja
Capítulo II. Caminhar juntos na vida diária.
Capítulo III. Um renovado impulso missionário
Capítulo IV. Formação integral
Conclusão

1. 
INTRODUÇÃO
O evento sinodal que vivemos
1. «Derramarei o meu Espírito sobre toda a criatura; os vossos filhos e as vossas filhas hão de profetizar; os vossos jovens terão visões, e os vossos velhos terão sonhos» (At 2, 17; cf. Jl 3, 1). Foi a experiência que fizemos neste Sínodo, caminhando juntos e colocando-nos à escuta da voz do Espírito. Ele surpreendeu-nos com a riqueza dos seus dons, cumulou-nos da sua coragem e da sua força para levar a esperança ao mundo. 
Caminhamos juntos, com o sucessor de Pedro, que nos confirmou na fé e nos fortaleceu no entusiasmo da missão. Não obstante tenhamos vindo de contextos muito diferentes do ponto de vista cultural e eclesial, sentimos desde o início uma sintonia espiritual, um desejo de diálogo e uma verdadeira empatia. Trabalhamos juntos, compartilhando aquilo que era mais importante para nós, dando a conhecer as nossas preocupações, sem esconder as nossas dificuldades. Muitas intervenções geraram em nós emoção e compaixão evangélica: sentimo-nos um único corpo que sofre e rejubila. Queremos partilhar com todos a experiência de graça que vivemos e transmitir a alegria do Evangelho às nossas Igrejas e ao mundo inteiro. 
A presença dos jovens representou uma novidade: através deles, no Sínodo ressoou a voz duma geração inteira. Caminhando com eles, peregrinos junto do túmulo de Pedro, experimentamos como a proximidade cria as condições para que a Igreja seja espaço de diálogo e testemunho de fraternidade que fascina. A força desta experiência ultrapassa qualquer dificuldade e fraqueza. O Senhor continua a repetir-nos: Não temais, Eu estou convosco!
O processo de preparação 
2. Recebemos grandes benefícios das contribuições dos Episcopados e da colaboração de pastores, religiosos, leigos, peritos, educadores e muitos outros. Desde o início, os jovens foram envolvidos no processo sinodal: o Questionário online, numerosos contributos pessoais e sobretudo a Reunião pré-sinodal são o sinal eloquente disto. A sua colaboração foi essencial, como na narração dos pães e dos peixes: Jesus conseguiu fazer o milagre graças à disponibilidade dum jovem, que ofereceu com generosidade aquilo de que dispunha (cf. Jo 6, 8-11). 
Todas as contribuições foram resumidas no Instrumentum laboris, que constituiu a sólida base do debate durante as semanas da Assembleia. Agora, o Documento final reúne o resultado deste processo, relançando-o para o futuro: exprime aquilo que os Padres sinodais reconheceram, interpretaram e decidiram, à luz da Palavra de Deus. 
O Documento final da Assembleia sinodal
3. É importante elucidar a relação entre o Instrumentum laboris e o Documento final. O primeiro é o quadro de referência unitário e sintético que sobressaiu depois de dois anos de escuta; o segundo é o fruto do discernimento realizado e contém os núcleos temáticos generativos, sobre os quais os Padres sinodais se concentraram com particular intensidade e paixão. Portanto, reconhecemos a diversidade e a complementaridade destes dois textos. 
Este Documento é oferecido ao Santo Padre (cf. Francisco, Episcopalis communio, n. 18; Instrução, art. 35 § 5) e também à Igreja inteira como fruto deste Sínodo. Dado que o percurso sinodal ainda não terminou, prevendo-se uma fase de aplicação (cf. Episcopalis communio, nn. 19-21), o Documento final será um roteiro para orientar os próximos passos que a Igreja é chamada a dar. 
* No presente documento, com o termo “Sínodo” entende-se, segundo o contexto, ora todo o processo sinodal em curso, ora a Assembleia geral que teve lugar de 3 a 28 de outubro de 2018. 

PROÉMIO
Jesus caminha com os discípulos de Emaús
4. Reconhecemos, no episódio dos discípulos de Emaús (cf. Lc 24, 13-35), um texto paradigmático para compreender a missão eclesial relativamente às jovens gerações. Esta página exprime bem aquilo que experimentamos no Sínodo e o que gostaríamos que cada uma das nossas Igrejas particulares pudesse viver na sua relação com os jovens. Jesus caminha com os dois discípulos que, incapazes de entender o sentido do que Lhe acontecera, se retiram de Jerusalém e da comunidade. Para estar em sua companhia, percorre o caminho com eles. Interroga-os e escuta com paciência a sua versão dos acontecimentos, para os ajudar a reconhecer aquilo que estão a viver. Depois, com afeto e energia, anuncia-lhes a Palavra, levando-os a interpretar à luz das Escrituras os factos que viveram. Aceita o convite para ficar com eles ao anoitecer: entra na noite deles. Enquanto O escutam, os seus corações abrasam-se e as suas mentes iluminam-se; na fração do pão, abrem-se os seus olhos. São eles mesmos que decidem retomar sem demora o caminho na direção oposta, para regressar à comunidade e compartilhar a experiência do encontro com o Ressuscitado. 
Em continuidade com o Instrumentum laboris, o Documento final divide-se em três partes, cadenciadas por este episódio. A primeira intitula-se «Pôs-Se com eles a caminho» (Lc 24, 15) e procura esclarecer aquilo que os Padres sinodais reconheceram do contexto onde os jovens estão inseridos, evidenciando os seus fundamentos e desafios. A segunda, «Os seus olhos abriram-se» (Lc 24, 31), é interpretativa, fornecendo algumas chaves de leitura fundamentais do tema sinodal. E a terceira, intitulada «Voltaram imediatamente» (Lc 24, 33), contém as decisões para uma conversão espiritual, pastoral e missionária. 

I PARTE
«PÔS-SE COM ELES A CAMINHO»
5. «Nesse mesmo dia, dois dos discípulos iam a caminho de uma aldeia chamada Emaús, que ficava a cerca de duas léguas de Jerusalém; e conversavam entre si sobre tudo o que acontecera. Enquanto conversavam e discutiam, aproximou-Se deles o próprio Jesus e pôs-Se com eles a caminho» (Lc 24, 13-15). 
Neste trecho, o evangelista mostra a necessidade que os dois viandantes tinham de procurar um sentido para os acontecimentos que viveram. Ressalta-se a atitude de Jesus, que Se põe a caminho com eles. O Ressuscitado deseja percorrer o caminho com cada jovem, acolhendo as suas expetativas, mesmo que sejam desiludidas, e as suas esperanças, ainda que sejam inadequadas. Jesus caminha, escuta, compartilha. 
Capítulo I
Uma Igreja à escuta
Ouvir e ver com empatia 
O valor da escuta
6. A escuta é um encontro de liberdades, que exige humildade, paciência, disponibilidade para compreender, esforço por elaborar de maneira nova as respostas. A escuta transforma o coração daqueles que a vivem, principalmente quando se colocam em atitude interior de sintonia e docilidade ao Espírito. Por conseguinte, não é somente uma recolha de informações, nem uma estratégia para alcançar um objetivo, mas representa a forma como o próprio Deus Se relaciona com o seu povo. Com efeito, Deus vê a miséria do seu povo e escuta a sua lamentação, deixa-Se tocar intimamente e desce para o libertar (cf. Ex 3, 7-8). Portanto, através da escuta, a Igreja entra no movimento de Deus que, no Filho, vem ao encontro de cada ser humano. 
Os jovens desejam ser ouvidos
7. Os jovens são chamados continuamente a realizar opções que norteiam a sua existência; exprimem o desejo de ser ouvidos, reconhecidos, acompanhados. Muitos sentem por experiência que a sua voz não é considerada interessante nem útil no âmbito social e eclesial. Em vários contextos, verifica-se pouca atenção ao seu clamor, de maneira particular ao daqueles que são mais pobres e explorados, e também a falta de adultos disponíveis e capazes de ouvir. 
A escuta na Igreja
8. Na Igreja, não faltam iniciativas e experiências consolidadas, através das quais os jovens podem vivenciar a hospitalidade e a escuta, fazendo ouvir a sua voz. No entanto, o Sínodo reconhece que nem sempre a comunidade eclesial sabe tornar evidente a atitude que o Ressuscitado teve em relação aos discípulos de Emaús, quando, antes de os iluminar com a Palavra, lhes perguntou: «Que palavras são essas que trocais entre vós, enquanto caminhais?» (Lc 24, 17). Às vezes predomina a tendência a oferecer respostas pré-fabricadas e receitas prontas, sem deixar sobressair as perguntas juvenis na sua novidade, nem entender a sua provocação. 
A escuta torna possível um intercâmbio de dons, num contexto de empatia. Permite que os jovens ofereçam a sua contribuição para a comunidade, ajudando-a a reconhecer novas sensibilidades e a formular perguntas inéditas. Ao mesmo tempo, estabelece as condições para um anúncio do Evangelho que alcance verdadeiramente, de modo incisivo e fecundo, o coração. 
A escuta dos pastores e de leigos qualificados
9. A escuta constitui um momento qualificador do ministério dos pastores, a começar pelos bispos; muitas vezes, porém, estão sobrecarregados de compromissos e têm dificuldade de encontrar tempo adequado para este serviço indispensável. Muitos relevaram a carência de pessoas experientes e dedicadas ao acompanhamento. Acreditar no valor teológico e pastoral da escuta pressupõe uma reflexão para renovar as formas com que se exprime, habitualmente, o ministério presbiteral e uma averiguação das suas prioridades. Além disso, o Sínodo reconhece a necessidade de preparar consagrados e leigos, homens e mulheres, qualificados para o acompanhamento dos jovens. O carisma da escuta, que o Espírito Santo faz nascer nas comunidades, poderia receber também uma forma de reconhecimento institucional para o serviço eclesial. 
As diversidades de contextos e culturas
Um mundo plural
10. A própria composição do Sínodo tornou visíveis a presença e a contribuição das várias regiões do mundo, salientando a beleza de ser Igreja universal. Embora num contexto de globalização crescente, os Padres sinodais pediram para colocar em evidência as numerosas diferenças entre âmbitos e culturas, inclusive dentro do mesmo país. Existe uma pluralidade de mundos juvenis, a tal ponto que, em determinados países, se tende a recorrer ao termo “juventude” no plural. Além disso, a faixa etária considerada pelo presente Sínodo (16-29 anos) não representa um conjunto homogéneo, mas é composta por grupos que vivem situações peculiares. 
Todas estas diferenças têm um profundo impacto sobre a experiência concreta que os jovens vivem: com efeito, dizem respeito às várias fases da idade evolutiva, às formas da experiência religiosa, à estrutura da família e à sua importância na transmissão da fé, às relações intergeracionais – como, por exemplo, o papel dos idosos e o respeito que lhes é devido –, às modalidades de participação na vida social, à atitude em relação ao futuro, à questão ecuménica e inter-religiosa. O Sínodo reconhece e acolhe a riqueza das diversidades das culturas, colocando-se ao serviço da comunhão do Espírito. 
Mudanças em curso
11. De particular pertinência é a diferença relativa às dinâmicas demográficas entre os países com alta taxa de natalidade, onde os jovens representam uma parcela significativa e crescente da população, e os países onde o seu peso se vai reduzindo. Outra diferença deriva da história, que diversifica os países e os continentes de antiga tradição cristã, cuja cultura é portadora duma memória que não se pode perder, dos países e continentes marcados, ao contrário, por outras tradições religiosas e onde o cristianismo constitui uma presença minoritária e às vezes recente. Além disso, noutros territórios, as comunidades cristãs e os jovens que fazem parte delas são alvo de perseguição. 
Exclusão e marginalização 
12. Além disso, entre os países e no interior de cada um deles, existem diferenças determinadas pela estrutura social e pelos recursos económicos à disposição, que separam, por vezes de modo nítido, quantos têm acesso a uma quantidade crescente de oportunidades oferecidas pela globalização, daqueles que, ao contrário, vivem à margem da sociedade ou no mundo rural e sofrem os efeitos de certas formas de exclusão e descarte. Várias intervenções indicaram a necessidade de que a Igreja permaneça, corajosamente, ao lado destes últimos e participe na criação de alternativas que eliminem a exclusão e a marginalização, intensificando o acolhimento, o acompanhamento e a integração. Para isso, é necessário ter consciência da indiferença que marca a vida também de muitos cristãos, para a superar com o aprofundamento da dimensão social da fé. 
Homens e mulheres
13. Não se pode esquecer a diferença entre homens e mulheres, com os seus dons peculiares, com as suas específicas sensibilidades e experiências do mundo. Esta diferença pode ser um âmbito onde surgem formas de domínio, exclusão e discriminação, das quais todas as sociedades e a própria Igreja têm necessidade de se livrar. 
A Bíblia, por um lado, apresenta o homem e a mulher como parceiros iguais diante de Deus (cf. Gn 5, 2): todas as formas de dominação e discriminação que se fundamentam sobre o sexo ofendem a dignidade humana. Por outro, apresenta a diferença entre os sexos como um mistério tão constitutivo do ser humano, que não se pode reduzir a estereótipos. Além disso, o relacionamento entre o homem e a mulher é compreendido em termos duma vocação que deve ser vivida em conjunto, na reciprocidade e no diálogo, na comunhão e na fecundidade (cf. Gn 1, 27-29; 2, 21-25), em todos os âmbitos da experiência humana: vida de casal, trabalho, educação e outros ainda. À sua aliança, Deus confiou a terra.
A colonização cultural
14. Muitos Padres sinodais provenientes de contextos não ocidentais recordaram que, nos seus países, a globalização acarreta autênticas formas de colonização cultural, que desenraízam os jovens das origens culturais e religiosas donde provêm. É necessário um esforço da Igreja para os acompanhar nesta passagem, a fim de não perderem os traços mais preciosos da sua identidade. 
Quanto ao processo de secularização, há diferentes interpretações. Enquanto alguns o vivem como preciosa oportunidade para se purificar duma religiosidade rotineira, ou então fundamentada em identidades étnicas e nacionais, para outros ele representa um obstáculo na transmissão da fé. Entretanto assistimos, nas sociedades secularizadas, a uma redescoberta de Deus e da espiritualidade; e isto constitui um incentivo para a Igreja recuperar a importância dos dinamismos próprios da fé, do anúncio e do acompanhamento pastoral. 
Um primeiro olhar sobre a Igreja de hoje 
O empenho educativo da Igreja
15. Não são poucas as regiões onde os jovens sentem a Igreja como uma presença viva e envolvente, que é significativa também para os seus coetâneos não-crentes, ou doutras religiões. As instituições educacionais da Igreja procuram acolher todos os jovens, independentemente das suas opções religiosas, proveniências culturais e situações pessoais, familiares ou sociais. Deste modo, a Igreja oferece uma contribuição fundamental para a educação integral dos jovens nas mais diversas partes do mundo. Isto realiza-se através da educação nas escolas de todos os tipos e graus, nos centros de formação profissional, nos colégios e nas universidades, mas também nos centros juvenis e nos oratórios; o referido empenho realiza-se também através do acolhimento de refugiados e deslocados, bem como do diversificado esforço envidado no campo social. Em todas estas presenças, ao trabalho educativo e à promoção humana a Igreja une o testemunho e o anúncio do Evangelho. Quando se inspira no diálogo intercultural e inter-religioso, a ação educativa da Igreja é apreciada até pelos não-cristãos, como forma de autêntica promoção humana. 
As atividades da pastoral juvenil
16. No caminho sinodal, sentiu-se a necessidade de qualificar vocacionalmente a pastoral juvenil, considerando todos os jovens como destinatários da pastoral vocacional. Ao mesmo tempo realçou-se também a necessidade de desenvolver processos pastorais completos, que acompanhem desde a infância até à vida adulta, inserindo na comunidade cristã. Constatou-se igualmente que vários grupos paroquiais, movimentos e associações juvenis realizam um processo eficaz de acompanhamento e formação dos jovens na sua vida de fé. 
A Jornada Mundial da Juventude – que nasceu duma intuição profética de São João Paulo II e permanece um ponto de referência inclusive para os jovens do terceiro milénio – e os encontros nacionais e diocesanos desempenham um papel importante na vida de numerosos jovens, porque proporcionam uma experiência viva de fé e de comunhão, que os ajuda a enfrentar os grandes desafios da vida e a assumir responsavelmente o seu lugar na sociedade e na comunidade eclesial. Assim, estas convocações podem remeter para o acompanhamento pastoral ordinário das várias comunidades, onde o acolhimento do Evangelho deve ser aprofundado e traduzido em opções de vida. 
O peso da gestão administrativa
17. Muitos Padres observaram que o peso das tarefas administrativas absorve, de modo exagerado e às vezes sufocante, as energias de numerosos pastores; isto constitui um dos motivos que dificultam o encontro com os jovens e o seu acompanhamento. Para tornar mais evidente a prioridade dos compromissos pastorais e espirituais, os Padres sinodais insistem sobre a necessidade de repensar as modalidades concretas do exercício do ministério. 
A situação das paróquias
18. Embora permaneça a primeira e principal forma de ser Igreja no território, várias vozes destacaram a dificuldade que sente a paróquia em constituir um lugar relevante para os jovens, tornando-se necessário repensar a sua vocação missionária. A sua escassa importância nos espaços urbanos, o pouco dinamismo das propostas, juntamente com as mudanças espaciotemporais dos estilos de vida exigem uma renovação. Não obstante as várias tentativas de inovação, amiúde o rio da vida juvenil corre à margem da comunidade, sem a encontrar. 
A iniciação à vida cristã
19. Muitos observam que os percursos da iniciação cristã nem sempre conseguem introduzir crianças, adolescentes e jovens na beleza da experiência de fé. Quando a comunidade se constitui como lugar de comunhão e como verdadeira família dos filhos de Deus, exprime uma força generativa que transmite a fé; ao contrário, onde ela cede à lógica da delegação e quando predomina a organização burocrática, a iniciação cristã é erroneamente entendida como um curso de instrução religiosa que em geral termina com o sacramento da Confirmação. Por conseguinte, é urgente repensar profundamente a abordagem da catequese e a ligação entre transmissão familiar e comunitária da fé, lançando mão dos processos de acompanhamento pessoais. 
A formação de seminaristas e consagrados
20. Os seminários e as casas de formação são lugares de grande importância, onde os jovens chamados ao sacerdócio e à vida consagrada aprofundam a sua escolha vocacional e amadurecem no discipulado. Por vezes estes ambientes não têm na devida conta as experiências precedentes dos candidatos, subestimando a sua importância. Isto impede o crescimento da pessoa e corre o risco de induzir mais à adoção de atitudes formais, do que ao incremento dos dons de Deus e à conversão profunda do coração. 
Capítulo II
Três pontos cruciais
As novidades do ambiente digital
Uma realidade invasiva
21. O ambiente digital carateriza o mundo contemporâneo. Amplas camadas da humanidade estão mergulhadas nele de maneira normal e contínua. Não se trata apenas de «usar» instrumentos de comunicação, mas de viver numa cultura amplamente digitalizada, que tem impactos extremamente profundos sobre a noção de tempo e de espaço, sobre a perceção de si, do próximo e do mundo, sobre a maneira de comunicar, aprender, obter informações, entrar em relação com os outros. Uma abordagem da realidade que tende a privilegiar a imagem relativamente à escuta e à leitura influencia o modo de aprender e o desenvolvimento do sentido crítico. Já se tornou evidente que «o ambiente digital não é um mundo paralelo nem puramente virtual, mas faz parte da realidade quotidiana de muitas pessoas, especialmente dos mais jovens» (Bento XVI, Mensagem para o XLVII Dia Mundial das Comunicações Sociais). 
A rede de oportunidades 
22. A web e as redes sociais constituem uma «praça» onde os jovens transcorrem muito tempo e se encontram facilmente, embora nem todos tenham igual acesso às mesmas, de modo particular em determinadas regiões do mundo. Contudo, elas constituem uma extraordinária oportunidade de diálogo, encontro e intercâmbio entre as pessoas, bem como de acesso à informação e ao conhecimento. Além disso, o mundo digital é um âmbito de participação sociopolítica e de cidadania ativa, e pode facilitar a circulação duma informação independente, capaz de tutelar eficazmente as pessoas mais vulneráveis, revelando as violações dos seus direitos. Em muitos países, a web e as redes sociais já constituem um lugar indispensável para alcançar e envolver os jovens nas próprias iniciativas e atividades pastorais. 
O lado obscuro da rede
23. O ambiente digital é também um território de solidão, manipulação, exploração e violência, até ao caso extremo da dark web. Os meios de comunicação digitais podem expor ao risco de dependência, isolamento e perda progressiva de contacto com a realidade concreta, impedindo o desenvolvimento de relações interpessoais autênticas. Novas formas de violência propagam-se através das redes sociais, por exemplo o cyberbullying; de igual modo, a web constitui um canal de divulgação da pornografia e de exploração das pessoas para fins sexuais ou através do jogo de azar. 
24. Por fim, no mundo digital existem gigantescos interesses económicos, capazes de atuar formas de controle que são tão cavilosas quão invasivas, criando mecanismos de manipulação das consciências e do processo democrático. Frequentemente, o funcionamento de muitas plataformas acaba por favorecer o encontro entre pessoas que pensam do mesmo modo, obstruindo o confronto entre as diferenças. Estes circuitos fechados facilitam a divulgação de informações e notícias falsas, fomentando preconceitos e ódio. A proliferação de notícias falsas é expressão duma cultura que perdeu o sentido da verdade e adapta a realidade a interesses particulares. A reputação das pessoas é comprometida através de processos sumários online. O fenómeno diz respeito também à Igreja e aos seus pastores. 
Os migrantes como paradigma do nosso tempo 
Um fenómeno pluriforme 
25. A nível mundial, os fenómenos migratórios representam um fenómeno estrutural, e não uma emergência transitória. As migrações podem verificar-se no interior do mesmo país, ou entre diferentes países. A preocupação da Igreja visa, de modo particular, aqueles que fogem da guerra, da violência, da perseguição política ou religiosa, dos desastres naturais devidos também às mudanças climáticas e da pobreza extrema: muitos deles são jovens. Em geral, partem em busca de oportunidades para si mesmos e para a sua família. Sonham com um futuro melhor, e desejam criar as condições para que isto se realize. 
Muitos Padres sinodais ressaltaram que os migrantes são um «paradigma» capaz de iluminar o nosso tempo e, de forma especial, a situação juvenil, recordando-nos a condição original da fé, ou seja, que somos «estrangeiros e peregrinos sobre a terra» (Hb 11, 13). 
Violência e vulnerabilidade
26. Outros migrantes partem atraídos pela cultura ocidental, às vezes alimentando expetativas irrealistas, que os expõem a grandes desilusões. Traficantes sem escrúpulos, não raro ligados aos cartéis da droga e das armas, exploram a fragilidade dos migrantes, que, ao longo do seu percurso, muitas vezes encontram a violência, o tráfico de seres humanos, o abuso psicológico e mesmo físico, e tribulações indescritíveis. É preciso destacar a particular vulnerabilidade dos migrantes menores não acompanhados e a situação de quantos são forçados a passar longos anos nos campos de refugiados ou que permanecem bloqueados por muito tempo nos países de trânsito, sem poder dar continuidade ao curso de estudos, nem expressar os seus talentos. Em certos países de chegada, os fenómenos migratórios suscitam alarme e temores, muitas vezes fomentados e explorados para fins políticos. Propaga-se assim uma mentalidade xenófoba, de clausura e retraimento em si mesmos, à qual é necessário reagir com determinação. 
Histórias de separação e de encontro
27. Os jovens que migram experimentam a separação do próprio contexto de origem e, muitas vezes, também um desenraizamento cultural e religioso. Esta fratura tem a ver também com as comunidades de origem, que perdem os seus elementos mais vigorosos e empreendedores, e as famílias, de forma particular quando migra um ou ambos os progenitores, deixando os filhos no país de origem. A Igreja desempenha um papel importante como referência para os jovens destas famílias divididas. Mas as histórias dos migrantes são feitas também de encontro entre pessoas e entre culturas: para as comunidades e as sociedades de chegada são uma oportunidade de enriquecimento e desenvolvimento humano integral de todos. Deste ponto de vista, as iniciativas de acolhimento, que têm como ponto de referimento a Igreja, desempenham um papel importante, podendo revitalizar as comunidades capazes de as pôr em prática. 
O papel profético da Igreja
28. Graças à variada proveniência dos Padres, o Sínodo permitiu o encontro de muitas perspetivas relativamente ao tema dos migrantes, de maneira especial entre países de partida e países de chegada. Além disso, voltou a ecoar o grito de alarme daquelas Igrejas cujos membros são obrigados a escapar da guerra e da perseguição e que veem, nestas migrações forçadas, uma ameaça para a sua existência. O próprio facto de englobar no seu interior todas estas diferentes perspetivas coloca a Igreja em condições de exercer, em relação à sociedade, um papel profético sobre o tema das migrações. 
Reconhecer e reagir a todos os tipos de abuso
Esclarecer a verdade e pedir perdão
29. Os vários tipos de abuso cometidos por alguns bispos, sacerdotes, religiosos e leigos provocam nas suas vítimas, incluindo numerosos jovens, sofrimentos que podem durar a vida inteira e aos quais nenhum arrependimento é capaz de pôr remédio. Este fenómeno propagou-se na sociedade, atinge também a Igreja e representa um sério obstáculo para a sua missão. O Sínodo reitera o firme empenho na adoção de rigorosas medidas de prevenção que impeçam a sua repetição, começando pela seleção e formação das pessoas às quais serão confiadas tarefas de responsabilidade e educacionais. 
Ir à raiz
30. Existem vários tipos de abuso: abusos de poder, económicos, de consciência, sexuais. Torna-se evidente a tarefa de erradicar as formas de exercício da autoridade nas quais se entroncam aqueles e de combater a falta de responsabilidade e transparência com que muitos casos foram tratados. O desejo de domínio, a falta de diálogo e de transparência, as formas de vida dupla, o vazio espiritual, assim como as fragilidades psicológicas constituem o terreno onde prospera a corrupção. Nomeadamente, o clericalismo «nasce duma visão elitista e excludente da vocação, que interpreta o ministério recebido mais como um poder a ser exercido do que como um serviço gratuito e generoso a oferecer; e isto leva a julgar que se pertence a um grupo que possui todas as respostas e já não precisa de escutar e aprender mais nada, ou então finge escutar» (Francisco, Discurso na primeira Congregação Geral da XV Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, 3/X/2018). 
Gratidão e encorajamento
31. O Sínodo expressa gratidão a quantos têm a coragem de denunciar o mal sofrido: eles ajudam a Igreja a tomar consciência do que aconteceu e da necessidade de reagir com determinação. Aprecia e encoraja também o compromisso sincero de incontáveis leigas e leigos, sacerdotes, consagrados, consagradas e bispos que se prodigalizam todos os dias, com honestidade e dedicação, ao serviço dos jovens. O seu trabalho é como uma floresta que cresce sem fazer barulho. Também muitos dos jovens presentes no Sínodo manifestaram gratidão a quantos os têm acompanhado, reiterando a grande necessidade de modelos. 
O Senhor Jesus, que nunca abandona a sua Igreja, dá-lhe a força e os instrumentos necessários para um caminho novo. Confirmando a linha das tempestivas «medidas e sanções tão necessárias» (Francisco, Carta ao Povo de Deus, 20/VIII/2018, n. 2) e ciente de que a misericórdia exige a justiça, o Sínodo reconhece que enfrentar a questão dos abusos em todos os seus aspetos, inclusive com a ajuda preciosa dos jovens, pode ser verdadeiramente uma oportunidade para uma reforma de alcance histórico. 
Capítulo III
Identidade e relações 
Família e relações intergeracionais 
A família como ponto de referência privilegiado
32. A família continua a ser o principal ponto de referência para os jovens. Os filhos apreciam o amor e os cuidados recebidos dos pais, fazem questão dos laços familiares e esperam conseguir, por sua vez, formar uma família. Indubitavelmente, o aumento de separações, divórcios, segundas uniões e famílias monoparentais pode causar grandes sofrimentos e crises de identidade nos jovens. Às vezes têm de assumir responsabilidades que não são proporcionais à sua idade, obrigando-os a tornar-se adultos antes do tempo. Frequentemente, os avós prestam uma contribuição determinante no afeto e na educação religiosa: com a sua sabedoria, são um elo decisivo na relação entre as gerações. 
A importância da maternidade e da paternidade
33. Mães e pais desempenham papéis distintos, mas igualmente importantes, como pontos de referência na formação dos filhos e na transmissão da fé. A figura materna continua a exercer uma função que os jovens consideram essencial para o seu crescimento, embora ela não seja suficientemente reconhecida dos pontos de vista cultural, político e laboral. Muitos pais cumprem com dedicação o papel que lhes é próprio, mas não podemos ignorar que, em determinados contextos, a figura paterna se mostra ausente ou efémera e, noutros, opressiva ou autoritária. Estas ambiguidades refletem-se também no exercício da paternidade espiritual. 
As relações entre as gerações
34. O Sínodo reconhece a dedicação de muitos pais e educadores que se esforçam profundamente por assegurar a transmissão dos valores, não obstante as dificuldades do contexto cultural. Em várias regiões, o papel dos idosos e a reverência pelos antepassados constituem um perne da educação e contribuem vigorosamente para a formação da identidade pessoal. Também a família alargada – que, em determindas culturas, é a família em sentido próprio – desempenha um papel importante. Mas alguns jovens sentem as tradições familiares como opressivas e abandonam-nas sob a pressão duma cultura globalizada que, às vezes, os deixa sem pontos de referência. Entretanto, noutras regiões do mundo, entre jovens e adultos não existe um conflito geracional propriamente dito, mas sim um alheamento recíproco. Às vezes os adultos não procuram ou não conseguem transmitir os valores fundamentais da existência, ou então assumem estilos tipicamente juvenis, transtornando o relacionamento entre as gerações. Deste modo, a relação entre jovens e adultos corre o risco de se deter no plano afetivo, sem tocar as dimensões educativa e cultural. 
Jovens e raízes culturais
35. Os jovens estão orientados para o futuro e enfrentam a vida com energia e dinamismo. Mas sentem-se tentados também a concentrar-se na fruição do presente, tendendo por vezes a prestar pouca atenção à memória do passado donde provêm e, de modo particular, dos numerosos dons que lhes foram transmitidos pelos pais, pelos avós e pela bagagem cultural da sociedade em que vivem. Ajudar os jovens a descobrir a riqueza viva do passado, conservando-a na memória e servindo-se dela para as suas decisões e possibilidades, constitui um gesto de amor autêntico para com eles, visando o seu crescimento e as opções que são chamados a realizar. 
Amizade e relacionamento entre coetâneos
36. A par das relações intergeracionais, não se podem esquecer as relações entre coetâneos, que constituem uma experiência fundamental de interação e progressiva emancipação do contexto da origem familiar. A amizade e o intercâmbio, frequentemente mesmo em grupos mais ou menos estruturados, possibilitam reforçar competências sociais e relacionais num contexto onde não se sentem avaliados nem julgados. A experiência de grupo constitui também um grande recurso para a partilha da fé e a ajuda recíproca no testemunho. Os jovens são capazes de guiar outros jovens, vivendo um verdadeiro apostolado no meio dos seus amigos. 
Corpo e afetividade 
Mudanças em curso
37. Os jovens reconhecem que o corpo e a sexualidade têm uma importância essencial para a sua vida, concretamente no percurso de crescimento da sua identidade, pois são imprescindíveis para viver a amizade e a afetividade. Todavia, no mundo atual, deparamo-nos com fenómenos em rápida evolução a seu respeito. Antes de tudo, os avanços da ciência e das tecnologias biomédicas influenciam fortemente a perceção do corpo, induzindo a pensar que se pode modificar sem limites. A capacidade de intervir no ADN, a possibilidade de inserir elementos artificiais no organismo (cyborg) e o desenvolvimento das neurociências constituem um grande recurso, mas ao mesmo tempo levantam questões antropológicas e éticas. Uma aceitação acrítica da abordagem tecnocrática do corpo debilita a consciência da vida como dom e o sentido do limite da criatura, que pode extraviar-se ou ser instrumentalizada pelos dinamismos da economia e da política (cf. Francisco, Laudato si’, n. 106). 
Além disso, em determinados contextos juvenis, propaga-se o fascínio por comportamentos de risco como instrumento para se explorar a si mesmo, procurar emoções fortes e obter o reconhecimento. Juntamente com a persistência de fenómenos antigos, como a sexualidade precoce, a promiscuidade, o turismo sexual, o culto exagerado da aparência física, hoje constatam-se a difusão invasiva da pornografia digital e a exibição do próprio corpo online. Estes fenómenos, a que estão expostas as novas gerações, constituem um obstáculo para o amadurecimento sereno. Indicam dinâmicas sociais inéditas, que influenciam as experiências e as decisões pessoais, tornando-as terreno duma espécie de colonização ideológica. 
A receção dos ensinamentos morais da Igreja
38. É neste contexto que as famílias cristãs e as comunidades eclesiais procuram levar os jovens a descobrir a sexualidade como uma grande dádiva habitada pelo Mistério, para viverem as relações de acordo com a lógica do Evangelho. Mas nem sempre conseguem traduzir este desejo numa educação afetiva e sexual adequada, que não se limite a intervenções esporádicas e ocasionais. Onde esta educação foi realmente adotada como uma opção propositiva, notam-se resultados positivos que ajudam os jovens a captar a relação entre a sua adesão de fé em Jesus Cristo e o modo de viver a afetividade e as relações interpessoais. Tais resultados exigem e encorajam um maior investimento de energias eclesiais neste campo. 
As perguntas dos jovens
39. A Igreja tem uma rica tradição sobre a qual construir e a partir da qual propor o seu ensinamento a respeito desta matéria: por exemplo, o Catecismo da Igreja Católica, a teologia do corpo desenvolvida por São João Paulo II, a Encíclica Deus caritas est de Bento XVI e a Exortação Apostólica Amoris laetitia de Francisco. Todavia os jovens, inclusive aqueles que conhecem e vivem este ensinamento, manifestam o desejo de receber da Igreja uma palavra clara e cheia de humana empatia. Com efeito, a moral sexual é frequentemente causa de incompreensão e afastamento da Igreja, uma vez que é sentida como um espaço de juízo e de condenação. Perante as mudanças sociais nas formas de viver a afetividade e a multiplicidade das perspetivas éticas, os jovens mostram-se sensíveis ao valor da autenticidade e da dedicação, mas muitas vezes sentem-se desorientados. Concretamente, manifestam um desejo explícito de diálogo sobre as questões relativas à diferença entre identidade masculina e feminina, à reciprocidade entre homens e mulheres, à homossexualidade. 
Formas de vulnerabilidade
O mundo do trabalho
40. O mundo do trabalho continua a ser um âmbito em que os jovens manifestam a sua criatividade e a capacidade de inovação. Ao mesmo tempo, eles experimentam formas de exclusão e marginalização. A primeira e mais grave é o desemprego juvenil, que em certos países atinge níveis exorbitantes. Além de os depauperar, a falta de trabalho suprime nos jovens a capacidade de sonhar e de esperar, privando-os da possibilidade de oferecer uma contribuição para o desenvolvimento da sociedade. Em numerosos países, esta situação depende do facto de alguns segmentos da população juvenil estarem desprovidos de adequadas capacidades profissionais, também por causa das deficiências do sistema educativo e formativo. Com frequência, a precariedade do emprego que aflige os jovens está relacionada com os interesses económicos que exploram o trabalho. 
Violência e perseguições 
41. Muitos jovens vivem em contextos de guerra e são vítimas da violência numa incalculável variedade de formas: raptos, extorsões, crime organizado, tráfico de seres humanos, escravidão e exploração sexual, estupros de guerra, etc. Outros jovens, em virtude da sua fé, têm dificuldade de encontrar um lugar nas respetivas sociedades e padecem vários tipos de perseguição, que vai até à morte. São numerosos os jovens que, por constrangimento ou por falta de alternativas, vivem perpetrando crimes e violências: crianças-soldado, grupos armados e criminosos, tráfico de droga, terrorismo, etc. Esta violência ceifa inúmeras jovens vidas. Abusos e dependências, assim como violência e perversão contam-se entre as razões que levam os jovens à prisão, com uma incidência particular sobre alguns grupos étnicos e sociais. Todas estas situações questionam e interpelam a Igreja. 
Marginalização e mal-estar social
42. Ainda mais numerosos no mundo são os jovens que padecem formas de marginalização e exclusão social, por motivos religiosos, étnicos ou económicos. Recordemos a difícil situação de adolescentes e jovens que ficam grávidas e o flagelo do aborto, bem como a propagação do HIV, as diferentes formas de dependência (drogas, jogos de azar, pornografia, etc.) e a situação das crianças e jovens de rua, que carecem de casa, família e recursos económicos; os jovens presos merecem uma atenção especial. Várias intervenções ressaltaram a necessidade de que a Igreja valorize as capacidades dos jovens excluídos e as contribuições que eles podem oferecer para as comunidades. Ela quer aliar-se corajosamente a eles, acompanhando-os ao longo de percursos de reapropriação da própria dignidade e dum lugar na construção do bem comum. 
A experiência do sofrimento
43. Em contraste com um estereótipo generalizado, também o mundo juvenil está profundamente marcado pela experiência da vulnerabilidade, da deficiência, da enfermidade e da dor. Em numerosos países aumenta, principalmente entre os jovens, a proliferação de formas de mal-estar psicológico, depressão, doença mental e distúrbios alimentares, associados a experiências de profunda infelicidade ou à incapacidade de encontrar uma posição no seio da sociedade; finalmente, não deve ser esquecido o trágico fenómeno dos suicídios. Os jovens que vivem estas diversificadas condições de mal-estar e as suas famílias contam com a ajuda das comunidades cristãs, mas nem sempre estas estão adequadamente equipadas para os acolher. 
O recurso da vulnerabilidade
44. Muitas destas situações são produto da “cultura do descarte”: os jovens contam-se entre as suas primeiras vítimas. Mas, esta cultura pode impregnar também os jovens, as comunidades cristãs e os seus responsáveis, contribuindo deste modo para a degradação humana, social e ambiental que angustia o nosso mundo. Para a Igreja, trata-se de um apelo à conversão, à solidariedade e a uma renovada ação educacional, tornando-se presente de maneira particular nestes contextos de dificuldade. Também os jovens que vivem nestas situações dispõem de recursos inestimáveis para partilhar com a comunidade e nos ensinam a confrontar-nos com o limite, ajudando-nos a crescer em humanidade. É inesgotável a criatividade com que a comunidade animada pela alegria do Evangelho pode ser uma alternativa ao mal-estar e às situações de dificuldade! Deste modo, a sociedade consegue experimentar que as pedras descartadas pelos construtores podem tornar-se pedras angulares (cf. Sl 118, 22; Lc 20, 17; At 4, 11; 1 Pd 2, 4). 
 
Capítulo IV 
Ser jovem hoje
Aspetos da cultura juvenil atual 
Originalidade e especificidade
45. As jovens gerações são portadoras duma abordagem da realidade com traços específicos. Os jovens pedem para ser acolhidos e respeitados na sua originalidade. Entre as caraterísticas específicas mais evidentes da cultura dos jovens foram apontadas a preferência atribuída à imagem relativamente a outras linguagens de comunicação, a importância das sensações e emoções como modo de se aproximar da realidade e a prioridade da vida concreta e da ação sobre a análise teórica. Revestem-se de grande importância as relações de amizade e a pertença a grupos de coetâneos, promovidas também graças às redes sociais. Em geral, os jovens são portadores duma abertura espontânea à diversidade, que os torna atentos às temáticas da paz, da inclusão e do diálogo entre culturas e religiões. Numerosas experiências de muitas partes do mundo testemunham que os jovens sabem ser pioneiros de encontro e diálogo intercultural e inter-religioso, na perspetiva da convivência pacífica. 
Compromisso e participação social
46. Embora de forma diferente relativamente às gerações passadas, o compromisso social constitui um traço caraterístico dos jovens de hoje. Ao lado de alguns indiferentes, existem muitos outros dispostos a comprometer-se em iniciativas de voluntariado, cidadania ativa e solidariedade social, que devem ser acompanhados e encorajados para fazer sobressair os talentos, as competências e a criatividade dos jovens, incentivando a assunção de responsabilidade por parte deles. O compromisso social e o contacto direto com os pobres continuam a ser uma ocasião fundamental de descoberta ou aprofundamento da fé, e de discernimento da própria vocação. É vigorosa e generalizada a sensibilidade pelos temas ecológicos e da sustentabilidade, que a encíclica Laudato si’ soube catalisar. Assinalou-se também a disponibilidade a empenhar-se em campo político para a construção do bem comum, que a Igreja nem sempre soube acompanhar, oferecendo oportunidades de formação e espaços de discernimento. No que diz respeito à promoção da justiça, os jovens pedem à Igreja um compromisso decidido e coerente, que erradique toda a conivência com uma mentalidade mundana. 
Arte, música e desporto 
47. O Sínodo reconhece e aprecia a importância que os jovens atribuem à expressão artística em todas as suas formas: são numerosos os jovens que empregam neste campo os talentos recebidos, promovendo a beleza, a verdade e a bondade, crescendo em humanidade e na relação com Deus. Para muitos, a expressão artística é também uma autêntica vocação profissional. Não podemos esquecer que, durante séculos, o “caminho da beleza” constituiu uma das modalidades privilegiadas de expressão da fé e de evangelização. 
De importância muito peculiar se reveste a música, que representa um verdadeiro ambiente onde os jovens estão constantemente imersos, assim como uma cultura e uma linguagem capazes de suscitar emoções e moldar a identidade. A linguagem musical constitui também um recurso pastoral, que interpela de modo especial a liturgia e a sua renovação. Às vezes, a homologação dos gostos numa perspetiva comercial ameaça comprometer o vínculo com as formas tradicionais de expressão musical e inclusive litúrgica. 
Igualmente significativo é o relevo que, entre os jovens, assume a prática desportiva, cujas potencialidades nos planos educativo e formativo a Igreja não deve subestimar, mantendo uma presença firme no seu interior. O mundo do desporto tem necessidade de ser ajudado a superar as ambiguidades que o permeiam, como a exaltação dos campeões, a condescendência a lógicas comerciais e a ideologia do sucesso a qualquer preço. Neste sentido, reitera-se o valor do acompanhamento e da assistência na prática desportiva às pessoas portadoras de deficiência. 
Espiritualidade e religiosidade
Os diferentes contextos religiosos
48. A experiência religiosa dos jovens é fortemente influenciada pelo contexto social e cultural em que vivem. Em certos países, a fé cristã é uma experiência comunitária forte e viva, que os jovens partilham com alegria. Noutras regiões de antiga tradição cristã, a maioria da população católica não vive uma pertença real à Igreja; contudo, não faltam minorias criativas e experiências que revelam um renascimento do interesse pela religião, como reação contra uma visão reducionista e sufocante. Noutros lugares ainda, os católicos, juntamente com as demais denominações cristãs, constituem uma minoria, que às vezes sofre discriminação e até perseguição. Por último, existem contextos onde se verifica um crescimento das seitas ou de formas de religiosidade alternativa; não raro, aqueles que as seguem sentem-se desiludidos e tornam-se hostis a tudo o que é religioso. Se, em determinadas regiões, os jovens não têm a possibilidade de manifestar publicamente a sua fé ou veem que não é reconhecida a própria liberdade religiosa, noutros lugares, sente-se o peso de escolhas – inclusive políticas – do passado, que minaram a credibilidade eclesial. Não é possível falar da religiosidade dos jovens, sem ter em consideração todas estas diferenças. 
A busca religiosa
49. Em geral, os jovens declaram que estão à procura do sentido da vida e demonstram interesse pela espiritualidade. Mas, por vezes, esta solicitude configura-se mais como uma busca de bem-estar psicológico do que abertura ao encontro com o Mistério de Deus vivo. De modo especial em determinadas culturas, muitos consideram a religião como uma questão privada e selecionam, a partir de diferentes tradições espirituais, os elementos em que descobrem as próprias convicções. Assim difunde-se um certo sincretismo, que se desenvolve segundo o pressuposto relativista de que todas as religiões são iguais. A adesão a uma comunidade de fé não é vista por todos como o caminho de acesso privilegiado ao sentido da vida, aparecendo acompanhada e por vezes até substituída por ideologias ou pela busca de sucesso nos planos profissional e económico, na lógica duma autorrealização material. Porém, mantêm-se vivas algumas práticas transmitidas pela tradição, como as peregrinações aos santuários, que às vezes envolvem um grande número de jovens, e expressões da piedade popular, frequentemente ligadas à devoção a Maria e aos Santos, que preservam a experiência de fé dum povo. 
O encontro com Jesus
50. A mesma variedade encontra-se na relação dos jovens com a figura de Jesus. Muitos reconhecem-No como Salvador e Filho de Deus e com frequência sentem-se próximos d’Ele através de Maria, sua Mãe, comprometendo-se num caminho de fé. Outros não mantêm uma relação pessoal com Ele, mas consideram-No um homem bom e uma referência ética. Outros ainda encontram-No através duma forte experiência do Espírito. Contrariamente, para outros constitui uma figura do passado, desprovida de relevância existencial ou muito distante da experiência humana. 
Enquanto Deus, a religião e a Igreja não passam de palavras vazias para numerosos jovens, os mesmos monstram-se sensíveis à figura de Jesus, quando ela é apresentada de modo atraente e eficaz. Também os jovens de hoje nos dizem de muitas maneiras: «Queremos ver Jesus» (Jo 12, 21), manifestando assim aquela sã inquietação que carateriza o coração de cada ser humano: «A inquietação da investigação espiritual, a inquietação do encontro com Deus, a inquietação do amor» (Francisco, Santa Missa por ocasião da abertura do Capítulo Geral da Ordem de Santo Agostinho, 28/VIII/2013). 
O desejo duma liturgia viva
51. Em vários contextos, os jovens católicos pedem propostas de oração e momentos sacramentais capazes de tocar a sua vida quotidiana, com uma liturgia dinâmica, autêntica e jubilosa. Em muitas regiões do mundo, a experiência litúrgica constitui o principal recurso para a identidade cristã e conta com uma participação ampla e convicta. Os jovens reconhecem nela um momento privilegiado de experiência de Deus e da comunidade eclesial e um ponto de partida para a missão. Em contrapartida, noutros lugares assiste-se a um certo afastamento dos sacramentos e da Eucaristia dominical, sentida mais como preceito moral do que feliz encontro com o Senhor Ressuscitado e com a comunidade. Em geral verifica-se, mesmo onde se oferece a catequese sobre os sacramentos, que é insuficiente o acompanhamento educativo para se viver a celebração em profundidade, entrar na riqueza mistérica dos seus símbolos e dos seus ritos. 
Participação e protagonismo
Os jovens desejam protagonismo
52. Perante as contradições da sociedade, muitos jovens desejam fazer render os seus talentos, competências e criatividade, e estão dispostos a assumir responsabilidades. Entre os temas que eles consideram mais importantes, sobressaem a sustentabilidade social e ambiental, as discriminações e o racismo. O envolvimento dos jovens obedece muitas vezes a abordagens inéditas, explorando inclusive as potencialidades da comunicação digital em termos de mobilização e pressão política: propagação de estilos de vida e modelos de consumo e investimento críticos, solidários e atentos ao meio ambiente; novas formas de compromisso e de participação na sociedade e na política; renovadas modalidades de previdência social que beneficiem as pessoas mais vulneráveis. 
As razões duma distância
53. O Sínodo está ciente de que um número consistente de jovens, pelos motivos mais variados, nada pede à Igreja, porque não a consideram significativa para a sua existência. Aliás, alguns pedem-lhe expressamente para ser deixados em paz, uma vez que sentem a sua presença como importuna e até mesmo irritante. Muitas vezes este pedido não nasce dum desprezo acrítico e impulsivo, mas mergulha as raízes mesmo em razões sérias e respeitáveis: os escândalos sexuais e económicos; a falta de preparação dos ministros ordenados, que não sabem reconhecer de maneira adequada a sensibilidade dos jovens; pouco cuidado na preparação da homilia e na apresentação da Palavra de Deus; o papel passivo atribuído aos jovens no seio da comunidade cristã; a dificuldade da Igreja dar razão das suas posições doutrinais e éticas perante a sociedade atual. 
Os jovens na Igreja 
54. Os jovens católicos não são meramente destinatários da ação pastoral, mas membros vivos do único corpo eclesial, batizados nos quais vive e age o Espírito do Senhor. Contribuem para enriquecer aquilo que a Igreja é, e não somente o que ela faz. São o seu presente e não apenas o seu futuro. Os jovens são protagonistas em muitas atividades da Igreja, nas quais oferecem generosamente o próprio serviço, em particular mediante a animação da catequese e da liturgia, o cuidado das crianças e o voluntariado a favor dos pobres. Movimentos, associações e congregações religiosas oferecem também aos jovens oportunidades de compromisso e corresponsabilidade. Ocasionalmente, a disponibilidade dos jovens encontra um certo autoritarismo e falta de confiança da parte de adultos e pastores, que não reconhecem de forma suficiente a sua criatividade e têm dificuldade de compartilhar as responsabilidades. 
As mulheres na Igreja
55. Entre os jovens emerge também a solicitação de maior reconhecimento e valorização das mulheres na sociedade e na Igreja. Numerosas mulheres desempenham um papel insubstituível no seio das comunidades cristãs, mas em muitos lugares há dificuldade em conceder-lhes espaço nos processos decisórios, mesmo quando estes não exigem responsabilidades ministeriais específicas. A ausência da voz e da visão feminina empobrece o debate e o caminho da Igreja, subtraindo ao discernimento uma contribuição valiosa. O Sínodo recomenda que todos se tornem mais conscientes da urgência duma mudança inevitável, inclusive a partir duma reflexão antropológica e teológica sobre a reciprocidade entre homens e mulheres. 
A missão dos jovens junto dos seus coetâneos
56. Em vários contextos há grupos de jovens, com frequência expressão de associações e movimentos eclesiais, que são muito ativos na evangelização dos seus coetâneos, graças a um claro testemunho de vida, a uma linguagem acessível e à capacidade de estabelecer autênticos laços de amizade. Este apostolado permite levar o Evangelho a pessoas que dificilmente seriam alcançadas pela pastoral juvenil normal e contribui para fazer amadurecer a própria fé daqueles que se comprometem nisto. Por isso, deve ser apreciado, apoiado, acompanhado com sabedoria e integrado na vida das comunidades. 
Desejo duma comunidade eclesial mais autêntica e fraterna
57. Os jovens pedem que a Igreja resplandeça por autenticidade, exemplaridade, competência, corresponsabilidade e solidez cultural. Às vezes, este pedido soa como uma crítica; mas, muitas outras, assume a forma positiva dum compromisso pessoal em prol duma comunidade fraterna, hospitaleira, jubilosa e comprometida profeticamente na luta contra a injustiça social. Entre as expetativas dos jovens, destaca-se de maneira especial o desejo de que, na Igreja, se adote um estilo de diálogo menos paternalista e mais franco.

II PARTE 
«OS OLHOS ABRIRAM-SE»
58. «E, começando por Moisés e seguindo por todos os profetas, [Jesus] explicou-lhes, em todas as Escrituras, tudo o que Lhe dizia respeito. Ao chegarem perto da aldeia para onde iam, fez menção de seguir para diante. Os outros, porém, insistiam com Ele, dizendo: “Fica connosco, pois a noite vai caindo e o dia já está no ocaso”. Entrou para ficar com eles. E, quando Se pôs à mesa, tomou o pão, pronunciou a bênção e, depois de o partir, entregou-lho. Então, os seus olhos abriram-se e reconheceram-No; mas Ele desapareceu da sua presença» (Lc 24, 27-31). 
Depois de os ter ouvido, o Senhor dirige aos dois viandantes uma “palavra” incisiva e decisiva, com autoridade e transformadora. Assim, com mansidão e fortaleza, o Senhor entra na sua morada, permanece com eles e compartilha o pão da vida: é o sinal eucarístico que permite abrirem-se finalmente os olhos aos dois discípulos. 
Um novo Pentecostes 
A ação do Espírito Santo
59. O Espírito Santo inflama o coração, abre os olhos e suscita a fé dos dois viandantes. Age desde os primórdios da criação do mundo, para que o projeto do Pai, de recapitular tudo em Cristo, alcance a sua plenitude. Atua em todos os tempos e em todos os lugares, na variedade dos contextos e das culturas, suscitando mesmo no meio das dificuldades e dos sofrimentos o compromisso em prol da justiça, a busca da verdade, a coragem da esperança. Por isso, São Paulo afirma que «toda a criação geme e sofre as dores do parto até ao presente» (Rm 8, 22). O desejo de vida no amor e aquela sã inquietação que habita o coração dos jovens fazem parte do grande anseio de toda a criação pela plenitude da alegria. O Espírito Criador age em cada um deles, inclusive naqueles que não conhecem Cristo, a fim de os conduzir à beleza, à bondade e à verdade. 
O Espírito rejuvenesce a Igreja
60. A juventude é um período original e estimulante da vida, que o próprio Jesus viveu, santificando-a. A Mensagem aos jovens, do Concílio Vaticano II (7/XII/1965), apresentou a Igreja como a «verdadeira juventude do mundo», que possui «a faculdade de se alegrar com o que começa, de se dar sem nada exigir, de se renovar e partir para novas conquistas». Através do seu frescor e da sua fé, os jovens contribuem para mostrar este rosto da Igreja, no qual se reflete «o grande Vivente, o Cristo eternamente jovem». Por conseguinte, não se trata de criar uma nova Igreja para os jovens, mas sim de redescobrir com eles a juventude da Igreja, abrindo-nos à graça dum novo Pentecostes. 
O Espírito na vida do crente 
61. A vocação do cristão é seguir Cristo, passando através das águas do Batismo, recebendo o selo da Confirmação e, na Eucaristia, tornando-se parte do seu Corpo. «Vem, pois, o Espírito Santo: depois da água, o fogo, e sereis transformados em pão, que é o Corpo de Cristo» (Agostinho, Sermão 227). No percurso da iniciação cristã, é sobretudo a Confirmação que permite aos crentes reviverem a experiência do Pentecostes com uma nova efusão do Espírito para o crescimento e a missão. É importante voltar a descobrir a riqueza deste sacramento, compreender o seu vínculo com a vocação pessoal de cada batizado e com a teologia dos carismas, e cuidar melhor da sua pastoral, a fim de que não se torne um momento formal e pouco significativo. Cada caminho vocacional tem o Espírito Santo como protagonista: Ele é o “mestre interior” pelo qual devemos deixar-nos conduzir. 
Uma autêntica experiência de Deus
62. A primeira condição para o discernimento vocacional no Espírito é uma autêntica experiência de fé em Cristo, morto e ressuscitado, recordando que esta «não é luz que dissipa todas as nossas trevas, mas lâmpada que guia os nossos passos na noite, e isto basta para o caminho» (Francisco, Lumen fidei, n. 57). Nas comunidades cristãs, às vezes corremos o risco de propor, mesmo sem querer, um teísmo ético e terapêutico, que corresponde à necessidade de segurança e de conforto do ser humano, em vez dum encontro vivo com Deus à luz do Evangelho e com a força do Espírito. Se é verdade que a vida só se desperta por meio da vida, torna-se claro que os jovens têm necessidade de encontrar comunidades cristãs realmente radicadas na amizade com Cristo, que nos conduz ao Pai na comunhão do Espírito Santo. 
Capítulo I
O dom da juventude
Jesus jovem entre os jovens
A mocidade de Jesus
63. Cristo, «jovem com os jovens, tornou-Se o seu modelo e santificou-os para o Senhor» (Ireneu, Contras as heresias, II, 22, 4): santificou a juventude pelo simples facto de a ter vivido. A narração bíblica apresenta um único episódio da juventude de Jesus (cf. Lc 2, 41-52), que foi vivida sem alvoroço, na simplicidade e laboriosidade de Nazaré, a ponto de ser reconhecido como «o carpinteiro» (Mc 6, 3), «o filho do carpinteiro» (Mt 13, 55). 
Contemplando a sua vida, podemos entender melhor a bênção da mocidade: Jesus teve uma confiança incondicional no Pai, cuidou da amizade com os seus discípulos e, até nos momentos de crise, permaneceu fiel a eles. Manifestou uma profunda compaixão pelos mais fracos, especialmente os pobres, os doentes, os pecadores e os excluídos. Teve a coragem de enfrentar as autoridades religiosas e políticas do seu tempo; viveu a experiência de Se sentir incompreendido e descartado; experimentou o medo do sofrimento e conheceu a fragilidade da Paixão; dirigiu o seu olhar para o futuro, colocando-Se nas mãos seguras do Pai e confiando na força do Espírito. Em Jesus, todos os jovens se podem rever com os seus receios e as suas esperanças, as suas incertezas e os seus sonhos, confiando-se a Ele. Na contemplação dos encontros de Jesus com os jovens, terão uma fonte de inspiração. 
Com o olhar do Senhor
64. A escuta de Cristo e a comunhão com Ele permitem, também aos pastores e aos educadores, amadurecer uma leitura sapiente desta fase da vida. O Sínodo procurou olhar para os jovens com a atitude de Jesus, a fim de discernir na vida deles os sinais da ação do Espírito. Efetivamente acreditamos que, também hoje, Deus fala à Igreja e ao mundo através dos jovens, da sua criatividade e do seu compromisso, bem como mediante os seus sofrimentos e os seus pedidos de ajuda. Juntamente com eles, podemos ler de maneira mais profética a nossa época, reconhecendo os sinais dos tempos; por isso, os jovens são um dos “lugares teológicos” onde o Senhor nos dá a conhecer algumas das suas expetativas e desafios para construir o futuro. 
Delineamentos da idade juvenil
65. A juventude, fase do desenvolvimento da personalidade, está marcada por sonhos que vão ganhando consistência, relações que adquirem cada vez mais substância e equilíbrio, tentativas e experiências, escolhas que traçam progressivamente um projeto de vida. Nesta fase da existência, os jovens são chamados a ir em frente mas sem cortar com as raízes, a construir autonomia mas não na solidão. Nem sempre o contexto social, económico e cultural oferece condições favoráveis. Muitos jovens santos fizeram resplandecer os delineamentos da idade juvenil em toda a sua beleza e foram, no seu tempo, verdadeiros profetas de mudança; o seu exemplo mostra do que os jovens são capazes, quando se abrem ao encontro com Cristo. 
Inclusive os jovens portadores de deficiência ou atribulados pela doença podem prestar uma contribuição preciosa. O Sínodo convida as comunidades a dar espaço a iniciativas que os reconheçam como protagonistas e lhes permitam sê-lo, por exemplo, com a utilização da língua gestual para surdos, itinerários catequéticos devidamente acessíveis, experiências associativas ou de inserção no mundo do trabalho.
A sã inquietação dos jovens
66. Os jovens são portadores duma inquietação que, antes de tudo, deve ser acolhida, respeitada e acompanhada, apostando com convicção na sua liberdade e responsabilidade. A Igreja sabe, por experiência, que a contribuição deles é fundamental para a própria renovação. Em certos aspetos, os jovens podem estar mais adiantados do que os pastores. Na manhã de Páscoa, o jovem Discípulo Amado chegou primeiro ao sepulcro, antecipando-se na corrida a Pedro, que lhe sentia pesar a idade e o renegamento (cf. Jo 20, 1-10); da mesma forma, na comunidade cristã, o dinamismo juvenil constitui uma energia renovadora para a Igreja, uma vez que a ajuda a libertar-se de pesos e atrasos, e a abrir-se ao Ressuscitado. Ao mesmo tempo, a atitude do Discípulo Amado indica que é importante permanecer em contacto com a experiência dos idosos, reconhecer o papel dos pastores e não avançar sozinho. Assim haverá aquela sinfonia de vozes, que é fruto do Espírito. 
Os jovens feridos
67. A vida dos jovens, como a de todos, está marcada também por feridas. Trata-se das feridas provocadas pelas derr